Homenagem: Linduarte Noronha

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  •  Entrevista
  •  Filmes da Mostra

    Cinema

    "Minha aproximação com o cinema é muito remota, muito remota mesmo. Eu posso dizer a você que é de origem quase infantil. Tudo começou com as famosas matinês de cinema, nessa idade de sete, oito anos, essa faixa etária, com os famosos seriados e com o magnetismo especial que um cinema exerceu sobre toda a minha geração, o famoso cinema São Pedro."





    Aruanda

    "Aruanda surgiu de uma reportagem jornalística. Porque eu sabia que muito tempo atrás, isso em 1958, eu teria de fazer uma reportagem sobre a festa do Rosário, em Santa Luzia do Sabugi (...) Fui com grande amigo meu, já falecido, Dulcídio Moreira, que era nesse tempo correspondente do O Estadão. (...) Foi uma verdadeira aventura. Porque de carro não ia lá na serra, tivemos que subir a cavalo, houve queda de cavalo durante a trajetória, e com um guia, levamos um guia para lá. Bem, lá fizemos todo o levantamento fotográfico, tanto ele como eu. Eu fiz para A União; ele para O Estado de S.Paulo. Ele mandou a reportagem dele para O Estado e eu publiquei a minha em A União, com o título ‘As Oleiras de Olho d’Água da Serra do Talhado’."




    Contra Jeca-Tatu

    "Porque eu dizia sempre ao pessoal que vivia em torno de cineclubes, que gostava de cinema da época, que houve uma fase aqui muito grande de cineclubes também, e em torno de crítica, que nós parecíamos o famoso personagem de Monteiro Lobato, o Jeca-Tatu intelectual, a gente falava demais e não fazia nada. E havia sempre essa conversa, era uma espécie de revolta ao conformismo, quer dizer, eu ficava revoltado quando eu começava a ler, começava a ter conhecimento do grupo inglês de documentário de Grierson, de Cavalcanti, o National Film Board, etc., os grandes trabalhos de pioneiros, do cinema e a gente perguntava: ‘E por que é que a gente não faz aquilo também?’ Era um pessoal que começou sem nada, começou sem equipamento, começou até ‘sem invenção’, incipiente num equipamento ainda de origem, nomes como Murnau, como Flaherty. Não tinham absolutamente nada. Com o Flaherty eu ficava impressionado, como o Flaherty fora designado para fazer uma pesquisa de mineralogia e fez um documentário, fez ‘Nanook’. Então a conversa nossa era um torno disso. ‘Não, mas a turma tinha dinheiro, podia se movimento e coisa e tal’, o pessoal me dizia, e a conversa sempre girava em torno disso. E simplesmente um dia, me lembro perfeitamente, a gente sentado em frente de A União, na Praça João Pessoa, eu digo: ‘Olha, eu estou com um roteiro pronto sobre o grupo de Serra do Talhado, o grupo negro, e eu vou me virar em equipamento’. Quer dizer, a grande preocupação nossa era o equipamento e o filme virgem."









    Flaherty

    "Antes, não. ‘Nanook’ eu vi depois, em 60, 61. Um documentário que eu tinha trazido aqui para João Pessoa, mas foi depois de Aruanda, foi ‘O homem de Aran’. Os documentários básicos clássicos, antológicos do cinema, eu fui ver posteriormente lá no próprio Instituto Nacional do Cinema Educativo. O documentário do Cavalcanti, por exemplo, o ‘Coal Face’, eu vi lá. (...) E muita coisa eu vi na Cinemateca paulista também. O que me impressionou mais a respeito do Flaherty talvez tenha sido a própria maneira dele trabalhar através de entrevistas. Uma coisa que me impressionou profundamente foi uma antiga entrevista que eu vi do velho, quando ele foi fazer o ‘Louisiana Story’. Chegou lá e não sabia como começar nada, porque era tudo estático, e o cinema era movimento. Eu tinha dezoito anos quando li essa entrevista do Flaherty, em Cena Muda. Ele passou um mês sentado debaixo daquelas árvores lá da Flórida, esperando então uma coisa que motivasse o roteiro dele. Então um dia ele vê uma prancha com uma torre de petróleo atravessando de um lado para o outro e a torre oscilando. Ele deu um pulo. Uma torre de petróleo oscilar? Então foi inspiração cinematográfica dele, de movimento, em ‘Louisiana Story’. Então o estalo, o eureka dele foi exatamente isso, foi o problema do surgimento do movimento, que ele até então não tinha encontrado a motivação para o filme. Quer dizer, você sabe que essas coisas ficam, isso vai valendo, a experiência das gerações anteriores. E isso me ficava, eu tinha quinze, dezesseis anos de idade, dezessete. E então a minha preocupação quando fiz Aruanda foi exatamente o problema do movimento, porque eu já sabia que os velhos mestres iam falar: ‘Cuidado com o estático, cuidado com o elemento morto, cuidado com aquilo que não tem vida’."


    O Cajueiro Nordestino

    "Eu não fiz em 61 ‘O Cajueiro’ porque perdi o ciclo do caju. Uma coisa e outra, quando eu vi tinha passado o ciclo e aí tive que esperar um ano. Documentário artificial não vai, fazer caju de cera não dá, eu tenho horror a isso."





    O Roteiro no Documentário

    "Trabalhamos rigorosamente dentro do roteiro, quer dizer, com algumas modificações. Fiz um roteiro rígido porque havia muita teoria na cabeça, dos teóricos da época. Bela Balázs, O “Tratado de Realização Cinematográfica", Eisenstein, etc. Eu andava lendo esse pessoal todo, desde os catorze anos, quinze anos de idade. O roteiro pra gente era uma base, era o alicerce do cinema. O velho Cavalcanti dizia, inclusive, naquele livro ‘Filme e Realidade’: ‘Você terminou seu roteiro, terminou seu filme’. Aquelas coisas a gente tinha na cabeça, então a gente achava que sem roteiro não havia filme. Era um tabu."





    BIBLIOGRAFIA
    MARINHO, JOSÉ. DOS HOMENS E DAS PEDRAS: O CICLO DO CINEMA DOCUMENTÁRIO PARAIBANO (1959-1979). NITERÓI, EDUFF, 1998.

    MOSTRA REALIZADA COM O APOIO DE: CINEMATECA BRASILEIRA, CTAV, SECRETARIA DE CULTURA DA PARAÍBA E CANAL BRASIL


  • 22 de Fevereiro de 2025