A retrospectiva que o É Tudo Verdade apresenta neste ano, em parceria com a Associação Cultural Babushka, propõe um mapeamento pioneiro, um fragmento que não esgota a prospecção e flagra um continente ainda a ser explorado e até demarcado: os documentários experimentais feitos no Brasil. Neste ciclo, foram programados 23 títulos produzidos entre 1929 e 2007.

Com a sociedade do espetáculo consolidada no país de gritantes contrastes, o impulso documental volta-se não apenas para a crítica da realidade, mas para a crítica dos instrumentos que representam a realidade. A falsa dicotomia à francesa (Lumière ou Méliès) já não sustenta a complexidade e ambigüidade de um mundo tornado imagem. Os caminhos não mais se bifurcam entre ficção e documentário, agora são pistas embaralhadas. Assim como a história do cinema experimental no Brasil é feita de lapsos e momentos pontuais, o recorte do documentário experimental também obedece à mesma ordem irregular de escassez episódica e rarefação quantitativa que, em proporção inversa, por vezes projeta um conjunto diversificado de filmes de rara fatura e confronto poético.

Embora de difícil definição, por conta de sua natureza de livre experimentação com a linguagem e com os métodos da produção do cinema, estes filmes operam num registro que desafia os pressupostos do documentário convencional, aproximando- se da enunciação abstrata da música, da configuração plástica da arte e até do artifício ficcional da narrativa.

Sob o signo do “anti”, a lógica se revolve e o improvável se reverte. No documentário experimental, o discurso pedagógico dá vez à digressão poética, e a certeza do real cede lugar à imaginação da verdade. Este programa é um convite à inteligência e à sensibilidade do espectador, para uma viagem audiovisual inesperada e sem fronteiras, sem deixar, naturalmente, de provocar a reflexão e a polêmica.

Carlos Adriano, Bernardo Vorobow e Amir Labaki
Curadores


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