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Edição 2000
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Retrospectiva Geraldo Sarno
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O Documentário Segundo Geraldo Sarno
"Difícil conceber roteiro para um documentário. O real é sempre mais complexo do que o conhecimento que se tem dele, esconde surpresas e armadilhas. Improvisa, e a câmera e o gravador podem apenas flagrar uma parcela do visto e vivido, e a vida é mais vasta que o cinema, e todo documentarista sabe que, realizado o filme, este fica sempre aquém da soma de conhecimentos, relações e sentimentos que acumulou durante a filmagem.
O documentário, uma vez acabado, constrói sua própria realidade. A peleja entre a câmera e o real, na construção do filme não ficcional, parece-me a busca de organizar elementos no espaço. Explico: filma-se o plano, relacionando-o com os que o antecederam, com o que será filmado após; estrutura-se uma seqüência. Está preenchido um espaço. A ordenação final desses espaços preenchidos é uma tarefa de montagem. Só a intuição tem o poder mestre de aventurar-se a prever, enquanto se filma, a ordenação temporal da seqüências e de seus múltiplos elementos internos.
Essa relação de elementos no tempo, que no documentário cabe sobretudo à montagem, no filme de ficção parece-me ser o objetivo básico do roteiro. Ele traça o itinerário, o percurso, a direção - portanto roteiro - de elementos que podem ser transformados ou substituídos durante o período de realização do filme, inclusive improvisados."
(Trecho do artigo "Às margens do cinema", publicado no livro "Coronel Delmiro Gouveia", editora Codecri-Pasquim, Rio de Janeiro, 1979)
"Na verdade o que o documentário realmente documenta com veracidade é a minha maneira de documentar. Ainda assim, devo admitir que essa maneira de documentar (supondo-se que ela pudesse ser configurada num corpo orgânico de regras e princípios filosóficos, estéticos, etc.) estaria determinada por uma questão de produção, por situações de ordem técnica e por limitações que decorrem de meu maior e menor domínio dos meios de realização, como minha maior ou menor experiência etc. Quer dizer, entre o originalmente imaginado - a minha maneira de conceber um tema - e a forma definitiva que ele assume na obra acabada há uma distância a percorrer durante a qual o projeto inicial sofre modificações. E a questão ainda se complica quando verifico que o objeto a ser documentado, o outro, o mundo, é vivo, reage e é seguramente mais rico e complexo que o previamente imaginado. A minha afirmação inicial, a de que o documentário realmente documenta com veracidade é a minha maneira de documentar, estará talvez mais correta se também concebo como maneira de documentar a minha peculiar maneira de reagir às situações e questões concretas que surgem durante a realização. A prática quase sempre me força a agir assim. Mas nem sempre estamos preparados para rejeitar a dualidade sujeito/ objeto, para transformar todas as etapas de realização de um filme documentário em etapas realmente criadoras, liberando a subjetividade e assimilando a invasão inesperada do real. Quando isto ocorre, antes mesmo que o espectador, o primeiro resultado quem o colhe sou eu mesmo com a ampliação de meu espaço anterior imagístico.
De qualquer maneira a subjetividade, assumida ou não conscientemente pelo realizador, impõe suas regras mesmo quando este busca a objetividade."
(Trecho do artigo "Quatro notas - e um depoimento - sobre o documentário", publicado na Revista Filme Cultura, edição nº 44, abril/ agosto 1984)
"A montagem é muito importante, como tudo, tudo é importante. Anteriormente eu te disse que o filme resulta sempre mais pálido do que a experiência toda que você viveu. Dá até certo desapontamento. A gente pode até comparar uma com uma foto em relação ao fato que aquela foto está documentando. Por outro lado o quê que ocorre? Ocorre que você passa dois meses no Nordeste, nesses dois meses você filma quase todo dia; você filma um cantador na feira, hoje, amanhã você pega a estrada, viaja, chega a uma tribo indígena, pára, fica três dias. Conhece, transa, documenta, filma, tal, e depois de três dias você cai na estrada, recolhe sua rede, sua parafernália, seu equipamento, bota tudo no carro, pega a estrada, vai não sei onde, faz um contato com não sei quem, com um advogado por exemplo. No outro dia você está filmando um grupo de camponeses, numa fazenda. Estão lá lutando pela terra. Você passa dois meses filmando coisas, as quais você pode até se vincular intensamente naquele determinado momento, três, quatro dias, depois você diz tchau, vai embora e vai abrir novas relações. Você passa dois meses fazendo isso, transando o Nordeste, a paisagem quente, o sertão. Aí você volta. Filmar significa preencher espaços de uma estrutura vazia, a qual você intuiu ou pré-viu. Os planos filmados vão preenchendo aquela estrutura, digamos, e a estrutura vai se modificando em função também do que você vai fazendo, a estrutura se modifica, ela vai se modificando, porque ocorrem coisas surpreendentes, e a estrutura vai se enriquecendo, ou não... Mas de qualquer maneira vai se transformando, no final desse processo a sua estrutura voltou muito mais densa, carregada de conteúdo, de significados, embora confusos. A montagem transa a relação entre a estrutura pré-vista já transformada e o aparente caos do material filmado."
(Trecho de entrevista concedida à Patrícia Monte-Mór e Waldo César e publicada na Revista Comunicações, do ISER, nº 10, ano 3, outubro de 1984)
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